Beato Carlos I da Áustria na Santa Missa, antes de tentar recuperar seu trono na Hungria em 1919. |
A
confessionalidade no Magistério da Igreja
Há quem pense que
a Igreja é partidária, desde o Concílio Vaticano II, da aconfessionalidade dos
Estados.
Cabe perguntar em
quais documentos conciliares se baseiam. Suponho que não será no Decreto
"Apostolicam Actuositatem", que, entre outras coisas, diz: "A
ordem temporal deve ser construída de tal modo que, respeitadas integralmente
as suas leis próprias, se torne, para além disso, conforme aos princípios da
vida cristã". "Os católicos sintam-se obrigados a promover o bem
comum na dedicação à pátria e no fiel cumprimento dos deveres civis, e façam
valer o peso da sua opinião de modo a que o poder civil se exerça com justiça e
as leis correspondam aos preceitos morais e ao bem comum". Nem tampouco a "Gaudium
et Spes", quando afirma: "Compete à sua consciência previamente bem
formada, imprimir a lei divina na cidade terrestre".
Se referem-se à
Declaração "Dignitatis Humanae", sobre a liberdade religiosa, é bom
recordar que a mesma se expressa clara e explicitamente que "em nada afeta
a doutrina católica tradicional acerca do dever moral que os homens e as
sociedades têm para com a verdadeira religião e a única Igreja de Cristo".
Qual é essa doutrina tradicional? Vejamos alguns exemplos. "...não é lícito
à alguns particulares, como tampouco aos Estados, prescindir de seus deveres
religiosos"; "tem o Estado político obrigação de admitir inteiramente
e abertamente professar aquela lei e práticas de culto divino que o mesmo Deus
demonstrou que quer" (Encíclica "Inmortale Dei" sobre a
constituição cristã dos Estados, de Leão XIII). "Se pois, um Estado não
pretende outro fim que a comodidade material e um progresso social abundante e
refinado, se se olvida de Deus no governo da república e se despreocupa de atender
as leis morais, este Estado se desvia lamentavelmente do fim que a natureza
mesma lhe prescreve" (Encíclica "Sapientiae Christianae", de
Leão XIII). "...a realeza de Cristo exige que todo o Estado se ajuste aos
mandamentos divinos e aos princípios cristãos no trabalho legislativo"
(Encíclica "Quas Primas", de Pio XI). "Reina, finalmente, Jesus
Cristo no Estado quando, reconhecidos neste as máximas honras devidas a Deus,
se atribuem a Deus a origem da autoridades e de todos os direitos..."
(Encíclica "Ubi Arcano", de Pio XI). "Sendo a fé em Deus o
fundamento prévio de toda ordem política e a base insubstituível de toda
autoridade humana, todos os que não querem a destruição da ordem nem a
supressão da lei, devem trabalhar energicamente para que os inimigos da religião
não alcancem o fim tão abertamente proclamados por eles" (Encíclica
"Caritate Christi", de Pio XI). "Quem deseja que a estrela da
paz apareça... esforce-se e trabalhe para dissipar os erros que tendem a
desviar do caminho moral ao Estado e seu poder... e fazer-lhes rechaçar ou
ignorar na prática a essencial dependência que os subordina à vontade do
Criador" (radiomensagem "Con Sempre", de Pio XII).
"... o aspecto mais sinistramente típico da época moderna consiste na
absurda tentativa de querer reconstruir uma ordem temporal sólida e fecunda
prescindindo de Deus, único fundamento em que pode manter-se" (Encíclica
"Mater et Magistra", de João XXIII). O Vaticano II, ademais, entende
a liberdade religiosa, não como uma indiferença do Estado ante a Religião Católica,
mas simplesmente como imunidade de coação. Ou seja, que nenhum Estado (que é o
modo ou a forma que se organiza e estrutura uma comunidade política) pode impôr
pela força à seus súditos uma determinada religião, nem tampouco impedir que
professem e pratiquem a religião que cada um deles, em consciência, estima como
verdadeira, "com tal que se respeite a justa ordem pública". Mesmo
assim, a Declaração aclara que o Estado pode outorgar "um especial
reconhecimento civil no ordenamento jurídico da sociedade" à Igreja
Católica, e intervir nos casos em que a prática de uma confissão religiosa
atente contra o bem comum da sociedade. Nada disso é, evidentemente,
incompatível com a confessionalidade católica do Estado. E assim expuseram em
seu dia, após o encerramento do Concílio, os Bispos espanhóis. E mais
recentemente, o Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé declarava em uma
entrevista: "Enquanto exista um consenso social sobre o fato de que os
valores fundamentais do Cristianismo constituem uma premissa para a legislação,
pode-se manter um vínculo relativamente estreito entre Estado, Sociedade e
Igreja, que tem sentido e não se contrapõem à liberdade de religião"
("O sal da terra", Cardeal Ratzinger, Edições Palabras - 1997).
Em que consiste a
confessionalidade
Tudo isto resumia
magistralmente, em 1973, o corunhês monsenhor Guerra Campos, Bispo de Cuenca:
"A doutrina da Igreja, reafirmada pelo Concílio Vaticano II, inclui, além
da proteção da liberdade civil ou imunidade de coação em matéria religiosa,
deveres positivos que a sociedade civil, enquanto tal, deve cumprir. Pode-se
resumir em dois grupos. Primeiro, em relação direta com a ordem espiritual: a)
dar culto à Deus; b) favorecer a vida religiosa dos cidadãos; c) reconhecer a
presença de Cristo na história e a missão da Igreja instituída por Cristo.
Segundo: em relação direta com a ordem temporal, inspirar a legislação e ação
de governo na lei de Deus proposta pela Igreja. Estes deveres, quando uma
sociedade civil reconhece como princípios fundamentais de sua vida pública,
constituem o núcleo essencial da confessionalidade em seu sentido pleno".
O que não é
confessionalidade
"A
reticência existente respeito do termo confessionalidade se deve à que foi
erroneamente equiparada a coisas muito diferentes. A realidade que nomeamos
como confessionalidade não é o que às vezes - frequentemente - se pensa.
Confessionalidade não é a perseguição ou discriminação dos não católicos.
Tampouco é a imposição coercitiva de práticas de culto e piedade a todos os
fiéis. Nem é a entrega do poder civil ao clero. Nem se identifica com a
exclusividade de uma opção política imposta a todos os católicos, como quando
se lhes é instado a união contra uma política gravemente má. Nem há porque
pensar que a confessionalidade implica que a Igreja aprove e endosse a priori
todos os atos e pormenores da sociedade que se professa oficialmente católica,
que não por isso deixam de ser melhoráveis, discutíveis ou injustos.
Confessionalidade católica não é nada disso. Nem tampouco consiste em empregar
o qualificativo "católico" no nome oficial da associação, sindicato
ou Estado: um título altissonante de brasão, mas vazio. Pelo contrário, é o
compromisso coletivo de uma sociedade de viver seriamente sua inspiração cristã
em toda sua profundidade e, portanto, também no plano institucional" (Luis
Maria Sandoval, "A catequese política da Igreja, Speiro - 1994).
Distinção entre
Igreja e Estado
A
confessionalidade do Estado não supõe sua confusão com a Igreja. Igreja e
Estado são duas sociedades perfeitas que se distinguem entre si por seus fins:
espiritual da Igreja, temporal do Estado. Esta distinção - que não é separação
- exclui dois extremos que se deve evitar: por um lado, a ingerência da
hierarquia eclesiástica em assuntos que são próprios da sociedade civil; e por
outro lado a instrumentalização da Igreja pelo Estado com fins políticos, ou
sua intromissão indevida em questões de exclusiva incumbência da Igreja. O fato
de que em algumas épocas não se observou como era devido esta distinção, não
significa que não seja possível fazê-la, nem autoriza pensar que o Estado
confessional se presta a tais recíprocas e ilícitas imiscuidades. Ademais,
casos históricos deu-se em que isso não foi assim. Por exemplo, a postura do
Papa com respeito a Henrique VIII demonstra a independência do Santo Padre
diante da pretensão do rei da Inglaterra de que reconhecesse a nulidade de seu
matrimônio. As lutas de Carlos I e Felipe II contra o arbitrário uso do poder
temporal dos Papas de seu tempo provam como é possível a independência da
autoridade civil, apesar de ser os mais firmes, sinceros e convencidos
defensores da Cristandade, e portanto da confessionalidade das sociedades. A Igreja ensina também que nem todas as condutas imorais têm porque ser reprimidas
pelo Estado, que ademais pode tolerar alguns males se se considera que sua
repressão pode acarretar outros maiores. Essa idéia pode reforçar ainda mais o
que viemos dizendo da distinção entre ambas as potestades. Mas também há coisas
que não se pode tolerar nunca, nem mesmo com o pretexto de conservar a paz
social, como recordaram bem recentemente dois documentos: a instrução
"Donum Vitae" da Congregação para a Doutrina da Fé; e a Encíclica
"Evangelium Vitae" de João Paulo II. A primeira em referência à fecundação "in vitro", e a segunda com respeito ao aborto.
Aclarada esta
distinção entre potestade civil e religiosa, não se há de olvidar, não
obstante, que "A ordem temporal não se pode considerar um sistema fechado
em si mesmo. Essa concepção imanentista e mundana, insustentável desde o ponto
de vista filosófico, é inadmissível no Cristianismo, que conhece através de São
Paulo - o qual reflete o pensamento de Jesus - a ordem e a finalidade da
criação, como tela de fundo da mesma Igreja. "Tudo é vosso", escrevia
o Apóstolo aos coríntios, para destacar a nova dignidade e o novo poder do
cristão. Mas acrescentava logo em seguida: "Vós sois de Cristo e Cristo de
Deus". Pode-se parafrasear esse texto, sem traí-lo, dizendo que o destino
do universo inteiro está vinculado a esta pertença" (João Paulo II,
Audiência geral - 09/02/1994).
"A vida da
comunidade política goza de autonomia própria (cf. Gaudium et Spes 36). Esta
autonomia, no entanto, não deve entender-se como uma independência dos
princípios morais, porque uma política privada de princípios éticos sãos, leva
inevitavelmente ao declive da vida social, e à violação da dignidade e dos
direitos da pessoa humana" (João Paulo II, Ao segundo grupo de Bispos da
Polônia - 15/01/1993).
Reconhecimento de
Deus e acatamento da Lei Eterna
A
confessionalidade do Estado supõe o reconhecimento de que toda autoridade vem
de Deus, que é Juiz, Legislador e Rei. Que como tal, Ele é o autor da Lei
Natural. E que esta deve inspirar e à ela deve-se submeter toda a legislação
do Estado, começando pela ordem constitucional. "Precisamente, o
reconhecimento e correspondente culto a Deus é o primeiro dever da Lei
Natural" (Questões e respostas, Esquemas de Documentação Doutrinal II -
Pág. 110). "A sociedade secularizada e permissiva ignora totalmente os
preceitos da Lei Natural, porque nega a existência de Deus ou, pelo menos, nega
sua condição de Legislador" (Amadeo de Fuenmayor, Legalidade, moralidade e
mudança social - EUNSA). E tampouco basta confessar um "deus"
qualquer , mas o Deus Uno e Trino manifestado em Jesus Cristo. Porque "a
Encarnação é o acontecimento decisivo da história; Dele depende a salvação
tanto do indivíduo quanto da sociedade em todas as suas manifestações. Se falta
Cristo, ao homem lhe falta o caminho para alcançar a plenitude de sua elevação
e de sua realização em todas as suas dimensões, sem excluir a esfera social e
política" ( João Paulo II, Ângelus - 17/03/1991). "A Lei Natural
(universal e imutável como a mesma natureza humana na que se faz impressa), se
bem pode ser conhecida pela razão (por isso obriga a todos os homens
independentemente de qual seja sua fé), a doutrina cristã nos diz que só a
Igreja pode interpretá-la com absoluta e total infalibilidade, já que a razão
humana, ferida pelo Pecado Original, é dada a cair facilmente no erro. Por isso
é lógico que quem nos confessamos católicos, em uma sociedade majoritariamente
católica, aspiremos a que o Estado na hora de governar, legislar e julgar,
tenha como ponto de referência principal o Magistério da Igreja, como garantia
de acerto, de que não se aparta das exigências da Lei Natural, de respeito aos
direitos fundamentais das pessoas e a autonomia dos corpos intermediários, de
promoção do bem comum e da justiça. Bens todos estes que repercutem, não só nos
cidadãos católicos, mas também nos que não são.
Com isso não
fazemos outra coisa que acolher o convite da mesma Igreja, que se oferece a si
mesma como luz e consciência dos Estados, das nações e de todas as sociedades.
" A distinção entre a esfera eclesiástica e os poderes públicos - ensina
João Paulo II - não deve fazer-nos olvidar que todos eles se dirigem ao homem;
e a Igreja, "mestra em humanidade", não pode renunciar a inspirar as
atividades que se dirigem ao bem comum. A Igreja não pretende usurpar as
tarefas e prerrogativas do poder político; mas sabe que deve oferecer também à
política uma contribuição específica de inspiração e orientação" (Aos
Bispos da Emilia-Romana - Itália, em visita "Ad limina" -
01/03/1991).E também: "É preciso, pois, que a concepção cristã da vida e
os ensinamentos morais da Igreja continuem sendo os valores essenciais que
inspirem todas as pessoas e grupos que trabalham pelo bem da nação... a
liberdade humana e seu exercício no campo da vida individual, familiar e social,
como a legislação que serve de marco à convivência na comunidade política,
encontram seu ponto de referência e sua justa medida na verdade sobre Deus e
sobre o homem" (João Paulo II ao presidente da Argentina, em visita
oficial - 17/12/1993). Quando, pelo contrário, a legislação do Estado se
fundamenta na vontade geral, está-se construindo sobre cimentos movediços,
arenosos. Porque a vontade, como a inteligência, debilitada uma e obscurecida a
outra pelo pecado de nossos primeiros pais, podem se equivocar, e de fato se
equivocam muitas vezes. A vontade das massas é, por outra parte, facilmente
moldável por aqueles que em cada momento detêm o poder político, financeiro e
jornalístico. Enquanto que frente à moral objetiva, frente a Lei Eterna que fielmente
custodia a Igreja, todo o poderio da plutocracia se estrela irremediavelmente,
pois não lhes é possível manusear a seu capricho o que é imutável Vontade do
Senhor, nem subornar a que por expressa promessa de seu Divino Fundador está
assistida pelo Espírito Santo até os fins dos tempos, para conservar incólume o
"depositum fidei". Quando se suprime Deus da Constituição das nações
- ou faz-se acaso uma vaga menção ao Deus Arquiteto Universal da maçonaria e
demais deístas - substitui-se sua Soberania pela soberania popular, e sua Lei
pela vontade geral; e se inicia um processo que - em uns casos mais lentamente
e em outros mais rápido - deriva no absolutismo e no totalitarismo, como vem
denunciando incansavelmente desde o começo de seu pontificado o Papa atualmente
reinante. E estes males afetam também por igual a católicos e não católicos.
Impossível
neutralidade dos Estados no referente a Deus e a ordem moral
"Aconfessionalismo.
Neutralidade. Velhos mitos que intentam sempre rejuvenescer. Te incomoda o
absurdo que é deixar de ser católico, ao entrar na universidade ou na
associação profissional, ou na assembléia ou no Parlamento, como quem deixa o
chapéu na porta?" (São Josemaria Escrivá de Balaguer, Caminho - nº353).
Não conheço nenhum caso prático de Estado neutro ou neutral. A História
confirma que os Estados, ou confessam o Deus verdadeiro - com tudo o que isso
implica -, ou divinizam a soberania popular e a vontade das maiorias - com tudo
o que isso implica também. (Ou o que é pior: fazem pública profissão de ateísmo
- caso dos Estados socialistas -, ou de uma falsa religião de intrínseca
natureza totalitária - tal como ocorre nos países islâmicos). E isso é
perigosíssimo, já que, como adverte o cardeal Ratzinger "...um Estado
agnóstico em relação com Deus, que estabelece o direito só à partir da maioria,
tende a reduzir-se desde seu interior a uma associação delitiva";
"...onde Deus resulta excluído, rege o princípio de organizações
criminosas, seja de forma forte ou atenuada. Isto começa a fazer-se visível
onde o assassinato de seres humanos inocentes - os não nascidos - se cobre com
a aparência de direito, porque este tem atrás de si a cobertura do interesse de
uma maioria" (Um Olhar para a Europa, Edições Rialp - 1993). E assim, de
fato, vemos que em nações de grande maioria católica, como são Espanha ou
Irlanda, ou quase todas as de Hispanoamérica, o sistema democrático liberal
conduziu paulatina mas progressivamente a aceitação de leis que eram
impensáveis sob um Estado confessional. (E não vale dizer que em algumas ainda
não se aprovou, por exemplo, o aborto. Não se aprovou ainda, mas admite-se que
seja submetido a aprovação, o que já é deixar uma porta aberta que em qualquer
momento pode-se passar; enquanto que a confessionalidade exclui de antemão e
explicitamente a possibilidade de discussão sobre esse tema).
Confessionalidade,
democracia e pluralismo
Creio que convém
esclarecer também que a confessionalidade católica do Estado não é incompatível
com uma sã democracia, e com um pluralismo político bem entendido. O
reconhecimento de Deus como fonte da Autoridade, não exclui que o Soberano
(seja Rei, seja Presidente) possa ser designado de formas diversas pelo povo, e
que este possa participar e intervir de diferentes maneiras e por distintos
canais nas tarefas de governo da comunidade nacional. O acatamento da Lei de
Deus, não impede ter em conta que o mesmo Deus que estabeleceu alguns preceitos
de obrigatório cumprimento para todos os homens de todos os lugares e de todos
os tempos, deixou inteira liberdade de opinião e de ação no tocante a numerosas
questões, que são discutíveis.
Os não-crentes no
Estado confessional
O fato de que
muitos de seus súditos não professem nenhuma religião, ou pratiquem outra
distinta da católica, não tem porque impedir sua participação na vida pública,
nem muito menos constituir motivo de marginalização dentro de um Estado
confessionalmente Católico. Pela mesma razão que o fato de que no seio de uma
família cristã alguns de seus membros abandonem a fé, não supõe sua exclusão da
vida familiar. E pelo mesmo motivo que não se impede o ingresso de não-crentes
em escolas confessionalmente católicas. Convém recordar que durante muitos
séculos, e até o reinado de Isabel e Fernando, tanto judeus como mouros puderam
conviver com os cristãos, em uma Espanha cujos Reinados, Condados e Senhorios
eram confessionalmente católicos; e que só se reproduz a expulsão de ambas
comunidades religiosas no momento em que se considera culpáveis de conspirar
contra o bem comum da sociedade (caso contemplado e justificado, como vimos, na
Declaração Conciliar). "Às perguntas de muitos, para o que não tem fé, hão
de valer essas regras?, há de ser a Lei causa da norma moral, reflexo de um
Direito natural no que não se crê?; à essas perguntas vamos contestar o
seguinte: Deve ficar claro, em todo momento, que a inspiração cristã das
leis... tem por objeto alcançar... a conformidade das leis positivas com a lei
natural... a defesa do direito de todos os homens - cristãos ou não - a viver
com arranjo à lei natural; ou seja, em conformidade às exigências da humana
natureza que concedeu ao criá-los.
E se ainda opõe a
objeção interrogante: "E para o que não crê em Deus"?, responderemos
que inclusive para o ateu, há de seguir pelas leis o que seja objetivamente
justo para a natureza humana e, por isso, adequado ao bem comum, único critério
ao que há de acudir o legislador. Por isso, quando para evitar a implantação do
divórcio, a legalização do aborto (ou qualquer das abomináveis legalizações de
hoje), se invoca o respeito a lei natural, não se refere isto a algo da vida de
fé, mas ao que - sempre! - corresponde a natureza do homem, a defesa da
dignidade humana frente às aberrações que a degradam" (Javier Nagore
Yárnoz, Verbo de maio-junho - 1985).
A confessionalidade
não compromete a Igreja
Tampouco creio
razoável aduzir contra a confessionalidade do Estado, que sua atuação pode
comprometer em algum momento o prestígio ou boa fama da Igreja. Isto poderia
ser assim se se identificam ou confundem Igreja ou Estado, ou se não se tem
claros os limites entre o opinável e o indiscutível, erros acima denunciados.
Mas é que ademais, por essa mesma razão, não só os Estados, mas tampouco os
indivíduos poderíamos confessar nossa fé, pois todos cometemos falhas e pecados
alguma vez, e vendo nossa má conduta, outros homens podem também pensar mal da
Igreja a que pertencemos. Logo: temos que manter oculto, cada um, nossa
condição de cristãos? Uma resposta afirmativa mal pode-se conciliar com
as exigências apostólicas às que pelo Batismo e a Confirmação nos vemos
comprometidos. Pois o mesmo pode-se aplicar a todo tipo de sociedades cristãs,
incluídos os Estados.
Conclusão
"O desafio
do século XXI consistirá em humanizar a sociedade e suas instituições mediante
o Evangelho, e dar novamente à família, às cidades e povos uma alma digna do
homem criado à imagem de Deus" (João Paulo II, À Plenária do Pontifício
Conselho para a Cultura - 10/01/1992).
"À vós, homens de Estado e responsáveis das
nações, repito uma vez mais minha profunda convicção de que o respeito de Deus
e o respeito do homem são inseparáveis. Constituem o princípio absoluto que
permitirá aos Estados e aos blocos econômicos superar seus
antagonismos" (João Paulo II, Carta Apostólica no L aniversário da II
Guerra Mundial - 26/08/1989).
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