"As obras de Suas mãos são verdade e justiça; Imutáveis os Seus preceitos; Irrevogáveis pelos séculos eternos; Instituídos com justiça e eqüidade." - Salmo 110, 7-8

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Cristo vence os males do mundo

Fonte: InfoCatólica - Reforma o apostasía (Tradução livre)

- Os males do mundo...Um tema triste.
- É um tema alegre. Cristo Salvador vence tudo: o pecado e a morte, a dor e o sofrimento, e nos comunica Sua vitória. É o Evangelho, a Boa Nova.

Reforma ou apostasia pretende, entre outras coisas, assinalar aquelas verdades da fé que estão obscurecidas, esquecidas ou negadas, para confirmá-las em Cristo, luz do mundo, de modo que iluminem e alegrem nossa vida, dando-nos respostas, concretamente, sobre o mistério do mal, que tantas vezes hoje escandaliza e entristece. Escrevo esses artigos pouco depois das grandes catástrofes sofridas no Haiti e no Japão.

- Grandes males afligem o homem, e lhes dão muito o que sofrer e o que pensar. Enfermidades terríveis, pobrezas e fome, solidão e injustiças, guerras e exílios, a interrupção do trabalho...Males enormes que surgem bruscamente: pestes devastadoras, como a que à partir de 1348 fez morrer um terço da população da Europa. A Besta comunista, que mata cem milhões de pessoas no século XX. A II Guerra Mundial, bombardeios como os de Hamburgo, Hiroshima, Nagasaki. Guerras civis. O terror vermelho no Camboja, terremotos, AIDS, epidemias...Às vezes são males enormes que passam, como um furacão, um terremoto, uma epidemia, um tsunami arrasador. Mas outras vezes são males enormes que perduram, e que, de certo modo, vêm a ser assimilados socialmente, como os milhões de abortos, a pobreza angustiante de grande parte da humanidade, as drogas, os crimes e delitos..."Assim tem sido sempre". É um mistério.

- O mal escandaliza aos que estão "sem Deus e sem esperança no mundo" (Efésios 2, 12). Já entre os filósofos mais antigos foram alguns que formularam o dilema ateu: ou Deus é ao mesmo tempo bom e onipotente, ou não existe. Mas se permite os enormes males que há no mundo, ou é bom, mas não é onipotente para evitá-los, ou é onipotente, mas não é bom já que os permite. Logo Deus não existe.

O homem que vive nas trevas, sem a luz da fé, tem reagido de diversas maneiras diante da provocação do mal. Trata de se refugiar  no prazer e na dissipação: "comamos e bebamos, porque amanhã morreremos" (I Coríntios 15, 32). Recorre às drogas ou ao suicídio. Tenta vencer o sofrimento dos males com um espírito impassível, como estóicos, budistas, confucianos. Em todo caso, para eles os males são ruins, absoluta e totalmente ruins, sem nenhum sentido positivo. Ás vezes o peso esmagador do mal ajuda aos homens a serem humildes e compassivos, resistentes à dor e à pobreza. Outras vezes esse mesmo peso lhes endurece com um egoísmo amargo, cruel, sem piedade para com o próximo. Alguns se voltam para Deus, mas para outros lhes justifica seu ateísmo ressentido e desesperado. Mondo Cane (Mundo Cão).

Atenas, durante o segundo ano de sua guerra com os espartanos (430 a.C.), quando sua vitória todavia parecia possível, sofreu uma devastadora peste, talvez de tifus, que matou um terço dos concentrados na cidade por ocasião da guerra. Naquela peste o mal foi causa de um perversão moral generalizada. Tucídides, general ateniense, em sua História da Guerra do Peloponeso (lib. II, 53), descreve minuciosamente os horrores corporais e sociais daquela peste, mas também as degradações espirituais que ocasionou: "A peste, sobretudo, marcou também na cidade o começo da desordem em outros aspectos...Nem o temor dos deuses nem nenhuma lei humana constituia um limite, pois consideravam igual a piedade que a impiedade, ao ver à todos morrendo o mesmo...Tinham já sobre suas cabeças uma condenação decretada, e era normal que gozassem algo da vida antes que lhe caisse em cima".

- O mal escandaliza também aos cristãos débeis na fé ou desviados pelas más doutrinas. Todos aqueles ambientes neo-modernistas da Igreja, que hoje se envergonham da cruz de Cristo, ridicularizam o amor à Cruz, aquele amor apaixonado, por exemplo, que deixou marcado em São Francisco de Assis os estigmas da Paixão de Cristo, ou no Santo Padre Pio.
Falam com desprezo da espiritualidade dolorista, depreciando a devoção à penitência. E quando sucedem de pronto grandes catástrofes, pregam a perplexidade da dúvida, o ressentimento para com Deus, a negação da Providência divina sobre o grande e o pequeno, dão patadas na Cruz...Transcrevo textualmente algumas das considerações ouvidas ou lidas à sacerdotes ou à escritores católicos por ocasião de uma grande catástrofe:

"Não entendemos porquê o mistério do mal envolve sempre nossas vidas"..."Nos críamos senhoras da natureza, e de pronto ela rompe todas as nossas previsões com um mistério que nos desconcerta"..."É compatível tanta dor com a existência de Deus?"..."Por quê Deus o tem permitido?"..."Desconcertados, preocupados, e ainda poderia dizer, indignados por tanta dor, nos perguntamos: onde está Deus? E desde a fé respondemos: "não está Deus na violência de uma natureza desmandada, que mata os homens". Nem sequer nos convence de todo a expressão "Deus o tem permitido", no que não encontramos consolo. Deus não intervém no processo de algumas leis da natureza, sempre inalteráveis e às vezes cruéis com a fragilidade do homem"..."Onde está Deus nesse sucesso espantoso? É inútil buscá-lo na brutalidade das forças desencadeadas da natureza. O encontraremos, no entanto, em tantas pessoas boas, que tem acudido e prestado ajuda generosamente: aí é onde está Deus"...Por estas ideias foi o pensamento de Abbé Pierre, dos Traperos de Emaús, quando, aos seus 93 anos, pouco antes de morrer (+ 2007), escreve o livro Mon Dieu...porquoi? (Plon 2005), Meu Deus...por quê? (Ediciones B 2006)...Dá pena e vergonha que sacerdotes e escritores católicos pensam e expressam como pagãos.

- Cristo Salvador é a Verdade total, que responde todas as perguntas do homem. Ele é o Consolador da humanidade (Isaías 40, São Lucas 2). E nEle temos de ser consoladores de uma humanidade que vive esmagada debaixo do peso de suas culpas, com muitas dificuldades e depressões. Por isso à todos os cristãos, à todos os que temos sido alegrados com o Evangelho, com a Boa Nova, nos corresponde um ministério de consolação. Hoje é especialmente necessário, quando o mundo, sobretudo no Ocidente descritianizado, havendo apostatado da fé em Cristo, tem ficado envolto às trevas e sombras da morte. E este ministério de consolação corresponde muito especialmente aos sacerdotes, posto que sempre tem de representar à Cristo entre os homens, e precisamente como Consolador. Por isso todos os discípulos de Cristo, sacerdotes e leigos, devemos ter na mente e no coração acendida a luz da fé e bem pronta a caridade para consolar.

"Bendito seja Deus, o Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai das misericórdias, Deus de toda a consolação, que nos conforta em todas as nossas tribulações, para que, pela consolação com que nós mesmos somos consolados por Deus, possamos consolar os que estão em qualquer angústia. Com efeito, à medida que em nós crescem os sofrimentos de Cristo, crescem também por Cristo as nossas consolações" (II Coríntios 1, 3-5).

Recordemos, pois, várias verdades fundamentais da nossa fé, que nestas situações trágicas temos que dar conformidade, paz e esperança à nós e à nossos irmãos. Citarei com frequência o Catecismo da Igreja Católica, indicando seus números entre colchetes [...].

Quis Deus fazer o homem livre. Poderia Deus ter feito homens não-livres, assegurados no bem automaticamente. E não haveria pecados, nem horríveis consequências do pecado. Mas não seriam imagens de Deus, não seriam homens. Quis Deus fazer criaturas-livres para que fossem imagem Sua, para que pudessem ser divinizadas pela graça de Cristo. Um cachorro, uma pedra, uma árvore não podem participar da natureza divina. O homem-livre bom sim, e o pecador também, se com a graça de Deus se converte.
Anjos e homens foram criados livres, com liberdade criaturas, limitadas, falíveis, e "por isso, diz o Catecismo, podem desviar-se. De fato pecaram. E foi assim como o mal moral entrou no mundo, incomparavelmente mais grave que o mal físico. Deus não é de nenhuma maneira, nem direta nem indiretamente, a causa do mal moral. Mas o permite [somente na medida julgada conveniente por sua bondade], respeitando a liberdade de sua criatura, e, misteriosamente, sabe tirar dele o bem: "porque o Deus Todo Poderoso...por ser soberanamente bom, não permitiria jamais que em suas obras existisse algum mal, se Ele não fosse suficientemente poderoso e bom para fazer surgir um bem do mesmo mal" (Santo Agostinho)" [311].

Todos os males do mundo procedem do pecado original e dos pecados que seguem durante a história humana. A profunda vigência atual do pelagianismo entre os cristãos é a explicação principal da surpreendente estupidez de não poucas pregações e comentários.
Antes do pecado humano, o mundo inteiro é uma manifestação quase infinita da sabedoria, da beleza, da bondade de Deus. Não há então enfermidades, nem maldades, nem guerras, nem injustiças, nem tampouco catástrofes naturais que angustiem a vida dos homens. Pelo contrário, "saída da bondade divina, a criação participa dessa bondade: "e viu Deus que era bom...muito bom" (Gênesis 1, 4. 10.12. 18. 21. 31)" [299]. Israel e a Igreja, em contraste notável com a maioria das religiosidades pagãs, tem a convicção alegre da bondade original do mundo criado: "quantas são tuas obras, Senhor, e todas fizeste com sabedoria!" (Salmos 103, 24).

Enquanto o homem se mantém unido à Deus, o mundo é para ele um paraíso, um quadro harmonioso e belo, sempre favorável, que se mantém sujeito ao seu domínio. Deus, de fato, deu ao homem poder para "submeter a terra e dominar" nela toda criatura (Gênesis 1, 28-29). Bendito seja, pois, o Senhor, autor de tantas criaturas maravilhosas, que até agora, depois do pecado, guardam sua dignidade majestosa e fascinante, ainda que imperfeitamente, e nos assombram e dilatam o coração.

É o pecado do homem que rompe horrivelmente a original harmonia do mundo e da vida humana. Ao rebelar-se o homem contra Deus, seu corpo se rebela contra a alma, e a natureza inteira se ergue contra o homem [386-390, 396-406].

- Alma-corpo: "a harmonia na que se encontravam [Adão e Eva no princípio], estabelecida graças à justiça original, é destruída. O domínio das faculdades espirituais da alma sobre o corpo se quebra (Gênesis 3, 7)". - Varão-mulher: "a união entre o homem e a mulher é submetida à tensões (3, 11-13), e suas relações estarão marcadas pelo desejo e o domínio (3, 16)". - Enfermidade e morte: "E por fim, a consequência explicitamente anunciada para o caso da desobediência [a morte] (2, 17) se realizará: o homem "voltará ao pó de que foi formado" (3, 19). A morte entra na história da humanidade (Romanos 5, 12)" [400]. - A mesma natureza humana está ferida, debilitada, transtornada: "toda a pessoa de Adão pela aquela ofensa de transgressão foi mudada para pior (in deterius commutatum), segundo o corpo e a alma" (Trento DS 1511).

Como disse o Vaticano II, "criado por Deus na justiça, o homem, no entanto, por instigação do demônio, no mesmo começo da história, abusou de sua liberdade, levantando-se contra Deus e pretendendo alcançar seu próprio fim à margem de Deus...E isto que a Revelação divina nos ensina coincide com a mesma experiência. Pois o homem, ao examinar seu coração, se descobre também inclinado ao mal e imerso em muitos males que não podem proceder de seu Criador, que é bom. Negando-se com frequência a reconhecer à Deus como seu princípio, rompeu a ordem devida com respeito à seu fim último e, ao mesmo tempo, toda a sua ordenação em relação consigo mesmo, com todos os outros homens, e com todas as coisas criadas" (GS 13a).

"Ignorar que o homem possui uma natureza ferida, inclinada ao mal, dá lugar à graves erros no campo da educação, da política, da ação social e dos costumes" [407]; e da atividade pastoral, catequética, missionária. Este erro pelagiano, unido como sempre ao arianismo, é hoje o erro mais grave e difundido entre os católicos.

A história trágica da humanidade conhecemos pelos livros, mas também se nos mostra no percurso de cada dia. Dia após dia nos faz comprovar que "desde este primeiro pecado, uma verdadeira invasão de pecado inunda o mundo: o fratricídio cometido por Caim em Abel (Gênesis 4, 3-15), a corrupção universal, a raiz do pecado (6, 5. 12; Romanos 1, 18-32)"...[401]. Inumeráveis desgraças e sofrimentos são causados pelo homem e pela natureza transtornada. É assim como a convivência humana se faz injusta e violenta - roubos, adultérios, abortos, opressões, mentiras, injustiças, fome, crimes e guerras intermináveis, polícias e juízes sempre transbordados, cárceres superlotados e degradantes, políticos corruptos ou incapazes, erros e horrores no campo da educação, da justiça, dos meios de comunicação, imprensa, televisão, cinema, etc.
Também o mundo criado se transtorna com o pecado da humanidade, e guardando todavia em parte sua harmonia originária, se faz em parte imprevisível e caótico: "a harmonia com a criação se rompe; a criação visível se faz para o homem estranha e hostil (Gênesis 3, 17. 19). Por causa do homem, a criação é submetida "à servidão da corrupção" (Romanos 8, 21) [400].

A ganância, a brutalidade, a torpe imprevisibilidade da humanidade pecadora altera profundamente a harmonia da criação visível, corta brutalmente as florestas, envenena a atmosfera, produz desertos ou áreas pantanosas, altera os ciclos climáticos, dá origem à uma alternância desastrosa de secas e inundações, causa pragas entre plantas e animais, e até faz com que a terra se estremeça em terremotos catastróficos.

Há um nexo misterioso entre o pecado da humanidade e a rebelião da natureza contra o homem. É impossível, claro, ver em cada caso o nexo causal concreto das catástrofes naturais. Mas o que parece certo é que nada disso - secas, inundações, terremotos, incêndios, etc. - existia no mundo antes do pecado dos homens. É palavra de Deus: "vossas culpas tem transtornado a ordem, vossos pecados os deixam sem chuva" (Jeremias 5, 25).

Antes do pecado humano, a terra é um paraíso, um Jardim do Éden, no qual toda natureza é favorável ao homem que a domina. Assim revela a Escritura Sagrada em textos, certamente, de muito difícil interpretação (Gênesis 2, 8-15; 3, 23-24; Ezequiel 28, 13-16; 36, 33-36; Joel 2, 3). Depois do pecado, Adão e Eva e sua descendência são expulsos do paraíso. E o Dilúvio ocorre "vendo Deus quanto havia crescido a maldade do homem sobre a terra, e como todos seus pensamentos e desejos tendiam sempre para o mal" (Gênesis 6, 5-8). São Paulo assinala a existência de uma misteriosa solidariedade entre o mundo criado e a humanidade, tanto na corrupção como na salvação: por isso agora as criaturas estão oprimidas "na servidão da corrupção", de modo que "a criação inteira geme e sente dores de parto", esperando "participar da liberdade gloriosa dos filhos de Deus" (cf. Romanos 8, 19-23). Quando Cristo foi assassinado na cruz "tremeu a terra, as rochas se partiram, os sepulcros se abriram" (São Mateus 27, 51-52), "o sol se eclipsou e a escuridão cobriu toda a terra" (São Lucas 23, 44).

Por último, e em primeiro lugar, sabemos que os males do mundo são diabólicos. O pior dos males que a humanidade sofre é o menos visível, o mais ignorado, o mais negado, o mais esquecido inclusive pelos crentes: "o diabo adquire um certo domínio sobre o homem, embora este permaneça livre. O pecado original, de fato, envolve a servidão sob o poder "daquele que possui o império da morte, ou seja, o diabo" (Hebreus 2, 14)...As consequências do pecado original e de todos os pecados pessoais dos homens conferem assim ao mundo em seu conjunto uma condição pecadora, que pode ser designada com a expressão de São João: "o pecado do mundo" (São João 1, 29)...E esta situação dramática do mundo, que "todo inteiro jaz no poder do Maligno" (I São João 5, 19; cf. I São Pedro 5, 8), faz da vida do homem um combate...contra os poderes das trevas" [407-409]. Não se entende nada do que passa no mundo se não se conhece e se recorda que através de toda a história humana se está travando "uma dura batalha contra o poder das trevas" (GS 37).

Mas Deus faz brilhar sempre uma luz na escuridão. No começo mesmo da história do pecado, inicia já o Senhor a história da graça e da esperança, como comprovaremos, com o favor de Deus, no próximo artigo.

José María Iraburu, sacerdote.

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