"As obras de Suas mãos são verdade e justiça; Imutáveis os Seus preceitos; Irrevogáveis pelos séculos eternos; Instituídos com justiça e eqüidade." - Salmo 110, 7-8

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Uma tragédia para a Igreja: o sacramento da confissão esquecido

Conferência do cardeal Joachim Meisner

Caros irmãos! Certamente não pretendo expor-lhes mais uma vez a teologia da penitência e da missão. Gostaria, em vez disso, juntamente com vocês, de me deixar guiar à conversão pelo próprio Evangelho, para que depois, enviados pelo Espírito Santo, possamos levar aos homens o anúncio de Cristo.
Neste caminho, gostaria de me deter agora com vocês sobre 15 pontos de reflexão.

1 Devemos voltar a ser uma “Igreja que vá ao encontro dos homens” (Geh-hin-Kirche), como gostava de dizer o cardeal Joseph Höffner, meu predecessor como arcebispo de Colônia. Isso, porém, não pode acontecer por vontade nossa. A isso deve-nos mover o Espírito Santo.
Um dos esmorecimentos mais trágicos de que a Igreja padeceu na segunda metade do século XX foi ter negligenciado o dom do Espírito Santo no sacramento da penitência. Em nós, sacerdotes, isso determinou uma terrível perda de estatura espiritual. Quando fiéis cristãos me perguntam: “Como podemos ajudar nossos sacerdotes?”, eu respondo sempre: “Vão se confessar com eles!”. Quando o sacerdote deixa de ser confessor, torna-se um operador social de caráter religioso. Falta-lhe, de fato, a experiência de sua maior conquista pastoral, a de colaborar para que um pecador, graças também a sua ajuda, deixe o confessionário novamente santificado. No confessionário, o sacerdote pode penetrar nos corações de muitas pessoas e receber disso um impulso, um encorajamento e inspirações para continuar a seguimento a Cristo.

2 Às portas de Damasco, um pequeno homem sofredor, São Paulo, cai cego por terra. Na Segunda Carta aos Coríntios, ele mesmo nos conta a impressão que sua pessoa dava a seus adversários: estava fisicamente fraco e incapaz de falar (cf. 2Cor 10, 10). Porém, é por intermédio desse pequeno homem sofredor que o Evangelho será anunciado nos anos seguintes às cidades da Ásia Menor e da Europa. As maravilhas de Deus nunca acontecem sob os refletores da história mundial. Estas sempre se realizam em lugar reservado: às portas da cidade, como no segredo do confessionário. Isso pode ser um grande conforto para todos nós, que temos grandes responsabilidades mas, ao mesmo tempo, consciência de nossas possibilidades muitas vezes limitadas. Faz parte da estratégia de Deus obter efeitos grandiosos usando de pequenos meios. Paulo, derrotado às portas de Damasco, transforma-se no conquistador das cidades da Ásia Menor e da Europa. Sua missão é reunir os chamados à Igreja, à Ecclesia de Deus. Ainda que esta – vista de fora – seja apenas uma pequena e oprimida minoria, e seja ostilizada também por dentro, Paulo a compara ao corpo de Cristo, ou melhor, identifica-a com o corpo de Cristo que é a Igreja. Essa possibilidade de “receber das mãos do Senhor” tem, em nossa experiência humana, o nome de “conversão”. A Igreja é a Ecclesia semper reformanda, e nela tanto o sacerdote quanto o bispo são semper reformandi: como Paulo em Damasco, devem ser sempre de novo derrubados do cavalo, para cair nos braços de Deus misericordioso, que nos envia depois ao mundo.

3 Por conseguinte, não é suficiente, em nosso trabalho pastoral, que nos limitemos a fazer correções nas estruturas da Igreja, para que se pareça mais atraente. Isso não basta! É necessária uma conversão do coração, do meu coração. Só um Paulo convertido pôde mudar o mundo, não um especialista em “engenharia eclesial”. O sacerdote, pelo fato de ser assimilado à forma de vida de Jesus, é tão habitado por Ele, que Jesus, no sacerdote, torna-se perceptível aos outros. Em Jo 14, 23 lemos: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra; meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada”. Essa não é apenas uma bela imagem! Se o coração do sacerdote ama a Deus e vive na graça, Deus uno e trino vem em pessoa e passa a morar no coração do sacerdote. É claro que Deus é onipresente, que Deus habita em todo lugar, que o mundo inteiro é como uma grande igreja de Deus. Mas o coração do sacerdote é como que o tabernáculo da igreja. Ali, Deus habita de modo todo misterioso e especial.

4 O maior dos obstáculos, aquele que não permite que Cristo seja percebido por nosso intermédio, é o pecado. Este impede a presença do Senhor em nossa existência; assim, nada nos é mais necessário que a conversão, também em vista da missão. Numa palavra, esse é o sacramento da penitência. Um sacerdote que não se põe frequentemente quer de um lado quer do outro da grade do confessionário sofre danos permanentes em sua alma e em sua missão. Certamente está aqui uma das principais causas da multiforme crise em que o sacerdócio veio a se encontrar nos últimos cinquenta anos. A graça toda particular do sacerdócio é justamente que o sacerdote pode-se sentir “em casa” de ambos os lados da grade do confessionário: como penitente e como ministro do perdão. Quando o sacerdote se afasta do confessionário, entra em grave crise de identidade. O sacramento da penitência é o espaço privilegiado para o aprofundamento da identidade do sacerdote, o qual é chamado a agir de modo que ele mesmo e todos os que creem voltem a se alimentar da plenitude de Cristo.
Na oração sacerdotal, Jesus fala dessa identidade ao seu e nosso Pai: “Eu não rogo que os tires do mundo, mas que os guardes do maligno. Eles não são do mundo, como eu não sou do mundo. Consagra-os pela verdade: a tua palavra é a verdade” (Jo 17, 15-17). No sacramento da penitência, a questão central é a verdade em nós. Por que não nos agrada olhar nos olhos da verdade?

5 Talvez devamos nos perguntar se já experimentamos a alegria de reconhecer um erro, de admiti-lo e de pedir perdão a quem ofendemos: “Vou voltar para meu pai e dizer-lhe: ‘Pai, pequei contra Deus e contra ti’” (Lc 15, 18). Pois, se é assim, também não conhecemos a alegria de ver o outro abrir os braços como o pai do filho pródigo: “Quando ainda estava longe, seu pai o avistou e foi tomado de compaixão. Correu-lhe ao encontro, abraçou-o e o cobriu de beijos” (Lc 15, 20). E também não podemos imaginar a alegria do pai ao reencontrá-lo: “E começaram a festa” (Lc 15, 24). Dado que essa festa é celebrada no céu toda vez que nos convertemos, por que não nos convertemos mais frequentemente? Por que – se podemos dizer assim – somos tão avaros com Deus e com os santos do céu, a ponto de dar tão raramente a eles a alegria de celebrar uma festa pelo fato que nos termos deixado abraçar, junto ao coração, pelo Senhor, pelo Pai?

6 Muitas vezes não gostamos desse perdão explícito. Todavia, Deus nunca se mostra tão Deus como quando perdoa. Deus é o amor! Ele é a doação em pessoa! Ele doa a graça do perdão. Mas o amor mais forte é aquele que supera o obstáculo principal do amor, ou seja, o pecado. A maior graça é sermos agraciados, e o dom mais precioso é dar (die Vergabung), é perdoar (die Vergebung). Se não houvesse pecadores que precisam mais do perdão que do pão de cada dia, não poderíamos reconhecer realmente as profundidades do Coração divino. O Senhor o sublinha explicitamente: “Eu vos digo: assim haverá no céu alegria por um só pecador que se converte, mais do que por noventa e nove justos que não precisam de conversão” (Lc 15, 7). Como é possível – nós nos perguntamos mais uma vez – que um sacramento que evoca tão grande alegria no céu suscite tamanha antipatia na terra? Isso se deve à nossa soberba, à constante tendência do nosso coração a entrincheirar-se, a bastar-se a si mesmo, a isolar-se, a fechar-se em si. Mas, na realidade, o que é que preferimos: ser pecadores a quem Deus perdoa, ou ser pessoas aparentemente sem pecado, ou seja, viver na ilusão de nos bastar a nós mesmos, privando-nos da manifestação do amor de Deus? É realmente suficiente que estejamos em paz com nós mesmos? Mas o que nós somos sem Deus? Só a humildade de uma criança, como a dos santos, nos permite suportar com letícia a desproporção entre a nossa indignidade e a glória de Deus.

7 A finalidade da confissão não é que nós, esquecendo os pecados, deixemos de pensar em Deus. A confissão nos permite, isto sim, o acesso a uma vida em que não é possível pensar em nada mais a não ser em Deus. Deus nos diz em nosso íntimo: “A única razão pela qual você pecou é porque não pode crer que eu o ame o bastante, que você realmente me interesse, que, em mim, você encontre a ternura de que precisa, que eu me alegre com o mais ínfimo gesto que testemunhe a sua acolhida, para lhe perdoar tudo o que você me traz na confissão”. Se reconhecêssemos um perdão como esse, um amor assim, seríamos como que inundados de alegria e de gratidão, a ponto de perder aos poucos a atração pelo pecado; e a confissão se tornaria um compromisso fixo cheio de alegria em nossa vida. Ir confessar-se significa começar a amar a Deus um pouco mais com o coração, ouvir de novo e experimentar eficazmente que Deus nos ama – pois a confissão não é apenas um incentivo que nos é dado de fora –; confessar-se significa recomeçar a crer nisso, e ao mesmo tempo a descobrir que até agora nunca cremos nisso o bastante profundamente e que, por isso, devemos pedir perdão. Diante de Jesus, nós nos sentimos pecadores, nós nos descobrimos como pecadores que não correspondem a Suas expectativas. Confessar-se significa deixar-se elevar pelo Senhor ao seu nível divino.

8 O filho pródigo abandona a casa do pai porque se tornou incrédulo. Já não tem confiança no amor do Pai, não acredita que esse amor o satisfaça, e, portanto, exige sua parte na herança para resolver sozinho os seus negócios. Quando se decide a voltar e a pedir perdão, seu coração ainda está morto. Crê que já não será amado, que já não será considerado filho. Volta apenas para não morrer de fome. Isso se chama contrição imperfeita. Mas o pai o esperava já fazia tempo. Fazia muito tempo que nada lhe dava mais alegria que o pensamento de que um dia o filho pudesse voltar para casa. Mal o vê de longe, corre ao seu encontro, abraça-o, nem lhe dá tempo de acabar sua confissão e chama a criadagem para que o vistam, alimentem e cuidem dele. Ante a demonstração de um amor tão grande, o filho nesse instante também começa a perceber esse amor, e se deixa invadir. Um arrependimento inesperado investe-o. Esta é a contrição perfeita. Só quando o pai o abraça é que ele mede toda a sua ingratidão, a sua insolência e a sua injustiça. Só então retorna realmente, volta a ser filho, aberto e cheio de confiança no pai, só então volta a estar vivo: “Teu irmão estava morto e tornou a viver” ( Lc 15, 32), diz o pai ao filho que tinha ficado em casa.

9 O filho mais velho, “o justo”, viveu uma mudança semelhante – era assim que gostaríamos que continuasse a parábola. O caso desse filho, porém, é muito mais difícil. Não podemos dizer que Deus ama mais os pecadores que os justos! Uma mãe não ama seu filho doente, a quem dirige seus cuidados particulares, mais que seus filhos sãos, que deixa brincando sozinhos, ao quais expressa seu amor – não certamente menor – de um modo diferente. Enquanto os homens se recusarem a reconhecer e a confessar seus pecados, enquanto continuarem a ser pecadores orgulhosos, Deus preferirá a eles os humildes pecadores. Deus tem paciência com todos. Até com o filho que ficou em casa, o pai tem paciência. Roga-lhe, e lhe fala com bondade: “Filho, tu estás sempre comigo, e tudo o que é meu é teu. Mas era preciso festejar e alegrar-nos” ( Lc 15, 31-32). O perdão à insensibilidade do filho mais velho não está expresso aqui, mas está implícito. Como deve ser grande a vergonha do filho mais velho diante de uma tal clemência! Ele havia previsto tudo, mas certamente não essa humilde ternura do pai. Inesperadamente, vê-se desarmado, confuso, participando da alegria comum. E pergunta a si mesmo como podia ter pensado em ficar intencionalmente à parte, como podia, mesmo por apenas um instante, preferir ser infeliz sozinho, enquanto todos os outros se amavam e se perdoavam mutuamente. Por sorte, o pai está ali e o agarra a tempo. Por sorte, o pai não é como ele! Por sorte, o pai é muito melhor que todos os outros juntos! Só Deus pode perdoar os pecados. Só Ele pode realizar este gesto de graça, de alegria e de superabundância de amor. É por isso que o sacramento da penitência é a fonte da permanente renovação e da revitalização da nossa existência sacerdotal.

10 Nesse sentido, na minha opinião o que evidencia a maturidade espiritual de um candidato ao presbiterado, mostrando que ele está pronto para receber a ordenação ao sacerdócio, é o fato de ele receber regularmente – pelo menos uma vez por mês – o sacramento da penitência. De fato, no sacramento da penitência eu encontro o Pai misericordioso e os dons mais preciosos que tem para dar, a doação (Vergabung), o perdão (Vergebung) e a graça. Mas quando alguém, por sua baixa frequência à confissão, é como se dissesse ao Pai: “Guarda para ti os teus dons preciosos! Eu não preciso de ti e de teus dons!”, deixa então de ser filho, pois se exclui da paternidade de Deus, já não quer receber seus dons preciosos. E, se alguém deixa de ser filho do Pai celeste, não se pode tornar sacerdote, porque o sacerdote é antes de tudo filho do Pai por meio do batismo, e depois, mediante a ordenação sacerdotal, é, com Cristo, filho com o Filho. Só então pode realmente ser irmão para os homens.

11 A passagem da conversão para a missão pode ser caracterizada, em primeiro lugar, pelo fato de a pessoa passar de um lado para o outro da grade do confessionário, do lado do penitente para o do confessor. Ter negligenciado o sacramento da penitência é a raiz de muitos males na vida da Igreja e na vida do sacerdote. E a chamada crise do sacramento da penitência não se deve apenas ao fato de as pessoas terem deixado de se confessar, mas também ao fato de nós, sacerdotes, já não estarmos presentes no confessionário. Um confessionário em que um sacerdote está presente, numa igreja vazia, é o símbolo mais tocante da paciência de Deus que espera. É assim que é Deus. Ele nos espera a vida inteira.
Em meus trinta e cinco anos de ministério episcopal, conheci exemplos comoventes de sacerdotes presentes cotidianamente no confessionário sem receber um só penitente; até que, um dia, o primeiro ou a primeira penitente, depois de meses ou anos de espera, finalmente aparece. Desse modo, poderíamos dizer, a situação se desbloqueia. A partir desse momento, o confessionário começa a ser muito frequentado. Ali, o sacerdote é chamado a deixar de lado todo o trabalho exterior de planejamento da pastoral com os grupos, para mergulhar nas necessidades pessoais de cada um. Ali, não deve sobretudo falar, mas ouvir. Uma ferida purulenta só pode sarar quando sangra até o fim. O coração ferido de um homem só pode sarar quando tem a possibilidade de sangrar até o fim, ou seja, quando pode desabafar por completo. E esse coração só pode desabafar quando tem alguém que o escute, na absoluta discrição do sacramento da penitência. Para o confessor, não é importante sobretudo falar, mas ouvir. Quantos impulsos interiores experimenta e recebe o sacerdote, para seu seguimento de Cristo, justamente quando administra o sacramento da penitência! Ali ele pode sentir e verificar o quanto os simples fiéis católicos, homens, mulheres e crianças, estão mais adiantados que ele no seguimento de Cristo.

12 Quando perdemos esse âmbito essencial do serviço sacerdotal, nós, sacerdotes, caímos facilmente numa mentalidade funcionalista ou ficamos presos ao nível da simples técnica pastoral. O fato de nos posicionarmos de ambos os lados da grade do confessionário nos leva, com o nosso testemunho, a permitir que Cristo se torne perceptível para as pessoas. Para esclarecer, dou um exemplo do ponto de vista negativo: quem entra em contato com material radioativo torna-se também radioativo. Se, depois, entra em contato com outra pessoa, esta outra também ficará igualmente contaminada pela radioatividade. Agora, olhando do ponto de vista positivo: quem entra em contato com Cristo fica “Cristo-ativo”. E se o sacerdote, sendo “Cristo-ativo”, entra em contato depois com outras pessoas, estas certamente serão “contaminadas” por sua “Cristo-atividade”. Isso é a missão, tal como sempre esteve presente no cristianismo, desde o início. As pessoas se apinhavam ao redor da pessoa de Jesus para tocá-lo, mesmo que fosse só a franja de seu manto. E eram curadas mesmo quando ele voltava as costas: “Porque dele saía uma força que curava a todos” ( Lc 6, 19).

13 Ao contrário, as pessoas muitas vezes fogem de nós, não se aproximam para entrar em contato conosco. Elas fogem de nós. Para evitar que isso aconteça, devemos nos fazer a pergunta: com quem elas entram em contato quando entram em contato comigo? Com Jesus Cristo, em seu ilimitado amor pelos homens, ou com alguma opinião teológica particular ou algum lamento a respeito da situação da Igreja e do mundo? Quando entram em contato conosco, entram em contato com Jesus Cristo? Se for assim, as pessoas virão. Se isso acontecer, falarão umas às outras de um sacerdote desse tipo, usarão a respeito dele palavras como estas: “Com esse a gente pode falar. Esse me entende. Ele pode me ajudar de verdade”. Estou profundamente convencido de que as pessoas têm saudades de sacerdotes assim, em quem autenticamente possam encontrar Cristo, que os livra de todas as amarras e os une a sua Pessoa.

14 Para poder perdoar realmente, precisamos de muito amor. O único perdão que realmente podemos conceder é o que recebemos de Deus. Só quando experimentamos o Pai misericordioso nos tornamos irmãos misericordiosos para os outros homens. Quem não perdoa não ama. Quem pouco perdoa, ama também pouco. Quem muito perdoa, muito ama. Quando deixamos o confessionário, que é o ponto de partida de nossa missão, quer de um lado, quer do outro lado da grade, mas especialmente do lado do penitente, temos realmente vontade de abraçar a todos, para pedir-lhes perdão. Eu mesmo já experimentei o amor de Deus que perdoa de modo tão gratificante, que me fez ter a urgência de pedir uma coisa só: “Acolha o perdão d’Ele também! Tome parte do perdão que eu acabo de receber em superabundância. E me perdoe por oferecê-lo tão mal a você!”. Com um único e mesmo gesto (a confissão), voltamos a entrar no amor de Deus e no amor fraterno, na união com Deus e com a Igreja, da qual o pecado nos havia excluído. Podemos e devemos amar a todos os homens, se Deus nos ensinou a amar de modo novo. Se não fosse assim, seria um sinal de que não nos confessamos bem e de que, portanto, deveríamos nos confessar de novo.
O santo Cura d’Ars foi provavelmente o maior confessor que a Igreja já teve. Graças a ele, temos o Ano Sacerdotal e este nosso encontro, como sacerdotes e bispos, com o Santo Padre, aqui em Roma. Refleti com esse santo pároco a respeito do mistério da santa confissão, já que seu ministério da reconciliação cotidiano, no confessionário de Ars, levou-o a tornar-se um grande missionário para o mundo: já disseram que, como confessor, ele venceu espiritualmente a Revolução Francesa. Tudo o que esse diálogo espiritual com João Maria Vianney me inspirou, eu disse até aqui. Mas ele me lembrou ainda algo muito importante.

15 Amemos a todos, perdoemos a todos! Mas atenção para não esquecer uma pessoa! Existe um ser que nos decepciona e nos pesa, um ser com o qual estamos constantemente insatisfeitos: nós mesmos. Normalmente, já estamos fartos de nós mesmos. Estamos cheios da nossa mediocridade e cansados com a nossa monotonia. Vivemos num estado de espírito frio e com uma incrível indiferença por esse próximo, que é o próximo mais próximo que Deus nos confiou, para que o levemos a ser tocado pelo perdão divino. Esse próximo mais próximo somos nós mesmos. De fato, lemos que devemos amar ao nosso próximo como a nós mesmos (cf. Lev 19, 18). Portanto, devemos amar também a nós mesmos, tal como procuramos amar ao nosso próximo. Devemos pedir a Deus, então, que nos ensine a perdoar a nós mesmos: a perdoar a raiva pelo nosso orgulho, a decepção com a nossa ambição. Roguemos a Ele que a bondade, a ternura, a paciência e a confiança indizíveis com que Ele nos perdoa nos conquistem a tal ponto, que nos libertemos do cansaço de nós mesmos que nos acompanha por toda parte, e muitas vezes nem chega a nos causar vergonha. Não podemos reconhecer o amor de Deus por nós sem modificar também a opinião que temos de nós mesmos, sem reconhecer ao próprio Deus o direito de nos amar. O perdão de Deus nos reconcilia com Ele, conosco, com nossos irmãos e irmãs e com o mundo todo. Torna-nos autênticos missionários.
Vocês acreditam nisso, meus queridos irmãos? Experimentem fazê-lo, hoje mesmo!

Fonte: 30 Dias - Na Igreja e no Mundo

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