Deus tem religião?

Um apanhado de comentários feitos pelos membros da comunidade Amigos da Montfort, no Orkut:

"Considerando que Ele não precisa religar-se a si mesmo?

Deus não precisa mesmo religar-se a si próprio. A consideração mais apropriada seria: qual religião religa o homem a Deus?

Como responder a esta pergunta no âmbito da Filosofia?

De maneira muito simples: abdicando da subjetividade e abraçando a objetividade, coisa meio apagada na decadadente filosofia moderna.

Destacando a raiz do vocábulo religar, a fé católica - que é a verdade em Deus - só pode ser chamada de religião porque existem outras correntes que também se denominam "religião".

Assim sendo, Deus NÃO tem religião; quem tem são os homens; uns são luteranos, outros adventistas, outros judeus e pagãos. Deus criou a Fé que chamamos de "católica" para que o homem se religue a Ele, e ela é chamada de religião porque é colocada a par com outros grupos que pretendem ter a mesma função.

O que é a Religião? Do ponto de vista do dogma, é o conjunto das verdades sobre o próprio Deus, conhecidas pela razão e/ou relevadas por Ele mesmo quando inatingíveis pelos homens.

Portanto, a doutrina da Religião [verdadeira] nada mais é do que o conjunto de verdades acerca da natureza do próprio Deus. Neste sentido, somente uma Religião, sobrenatural, será capaz de dizer ao homem quem é Deus.

Deus não "precisa" de uma Religião porque isto não faz sentido, mas a verdadeira Religião é um espelho de Deus, dizendo aos homens quem Ele é.

No Auto da Compadecida, aqueles personagens nordestinos morrem, e vão a Juízo. Em um diálogo, Jesus cita a Bíblia. Um dos personagens estranha a atitude de Cristo Juiz e diz que Jesus mais se parece um protestante (naquela época, católicos nem faziam questão de ler a Bíblia). O outro repreende dizendo que obviamente não, pois Jesus era católico.

O diálogo é divertidíssimo, e mostra a inocência-sábia daqueles miseráveis do interior que, mesmo sem saber o alfabeto, sabiam melhor o Catecismo do que muitos Padres com "doutorado" hoje.

Jesus é católico não porque Ele professa a Fé católica, mas porque a Fé católica professa-O, dizendo quem Ele é.

Quando discutimos com alguém, devemos usar de critérios comuns para ambos, a fim de que haja discussão. Do contrário, será uma conversa ininteligível, ou dois monólogos, cada um falando sozinho, sem atingir o outro. Portanto, com os protestantes, os católicos provam a Tradição Apostólica (que eles negam) através da Bíblia (que ambos aceitam). Com judeus, a discussão prova a legitimidade do Novo Testamento através do Antigo, que é comum aos interlocutores.

Mas com ateus/agnósticos/céticos, o único elemento comum é a razão. A discussão deve ser levada com argumentos de natureza metafísica, sendo que a sua parte mais elevada é a Teologia natural (erroneamente chamada de "Teogonia"), que é aquilo que se pode saber/deduzir sobre Deus através da razão.

O conjunto das verdades reveladas por Deus são o objeto da Sacra Teologia, a Teologia sobrenatural, pois a Teologia natural abrange somente o que o homem é capaz de saber naturalmente sobre Deus.

E o que o homem é capaz de saber naturalmente sobre Deus?

De Deus se sabe tudo o que se pode saber de uma causa através de seus efeitos. Daí dizer Santo Tomás na Summa que se pode chegar ao Perfeito através do imperfeito, e ao Imutável através do mutável."