"As obras de Suas mãos são verdade e justiça; Imutáveis os Seus preceitos; Irrevogáveis pelos séculos eternos; Instituídos com justiça e eqüidade." - Salmo 110, 7-8

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Hoje é dia de Santa Mônica





Ricardo Costa

"Este artigo pretende, à luz dos escritos de Santo Agostinho (Confissões e A Cidade de Deus), trazer à vida o preponderante papel exercido por Santa Mônica na formação do ideal cristão materno. Sua trajetória de vida, envolta pelo papel da mediação divina que lhe é atribuído por seu filho, marcará, de maneira quase indelével, o paradigma cristão materno, palpável em sua pessoa. Ela será o lado positivo na dualidade feminina cristã de Eva-Maria. Sua vida afirmará a cocretude do divino, colocando a maternidade cristã como a salvação da mulher. Como afirma São Paulo, embora a mulher seja submissa ao homem "porque primeiro foi formado Adão, depois Eva. E não foi Adão que foi seduzido, mas a mulher que, seduzida, caiu em transgressão", no entanto, "ela será salva pela sua maternidade, desde que, com modéstia, permaneça na fé, no amor e na santidade" (1 Ti 2, 12) Mônica é a salvação paulina personificada.
Quem foi Mônica antes de ser santa? Ou melhor, quem foi ela antes de ser algo? Sim, pois alçada à santidade, ela imediatamente perde seu "caráter" sexual. Santa, não mulher. Posteriormente Tomás de Aquino confirmaria a ausência de sexo, tanto em Deus quanto nos anjos (Suma contra os Gentios, III, 23). Aquino apenas endossou os escritos de Santo Agostinho; o mundo celeste é incorpóreo. Dante o confirmou: quando o poeta atinge o nono círculo, vislumbra pontos brilhantíssimos; são os anjos e Deus,
"Cosí l’ ottavo e ‘l nono; e ciascheduno píu tardo si movea, seondo, ch’ era in numero distante piú dall’ uno; e quello avea la fiamma piú sincera cui men distava la favilla pura
Oitavo e nono assim: mas se movia Mais lento cada qual, segundo ele era Mais longe do primeiro, que corria. E a flama rutilava mais sincera No que da Excelsa luz mais perto estava. (DANTE ALIGHIERI. A Divina Comédia, Paraíso, Canto XXVIII, 660-661).
Ainda segundo Agostinho, é através dos anjos que podemos nos aproximar de Deus:
"O que nos impede de nos unirmos a eles (os anjos) não é o facto de habitarmos na terra numa condição carnal, é o gosto do nosso coração impuro pelos bens terrenos. Quando sararmos para sermos tais quais eles são, então aproximar-nos-emos deles pela fé, se acreditarmos que pela sua assistência, Aquele que fez a felicidade deles fará a nossa" (AGOSTINHO. A Cidade de Deus, vol. 1, cap. XXV, 779).
É necessário que tracemos alguns aspectos do itinerário histórico de Mônica, mesmo através da ótica sagrada de seu filho, pois é nele que ela "fala" (inclusive seu inconsciente, como veremos), é por ele que se forma a sua imagem de mãe cristã.
Mônica "entra" na História através da obra Confissões, de seu segundo filho, Santo Agostinho (Aurelius Augustinus, 13.11.354 d.C.), escrita aproximadamente no ano de 397. Ela teria nascido no ano de 331 d. C., embora existam controvérsias quanto a essa data (A Igreja aceita a data de 331) (Liturgia das Horas - Ofício das Leituras, 1982: 1.534. Quanto à discordância da data, ver Webster’s Biographical Dictionary, 1953: 1.038). Seus pais eram cristãos, que se mantiveram católicos durante o cisma donatista (LOYN, 1990: 122).
Segundo Agostinho, Mônica foi criada por uma dada, termo que designava uma escrava incumbida de vigiar as crianças filhas de seus senhores. "Mônica enaltecia a vigilância de uma velha escrava, que já tomara meu avô materno às costas, sendo ainda menino, como é costume serem trazidas as crianças pelas raparigas mais crescidas" (Confissões, p. 223).
A velha escrava cuidou também de sua educação; Agostinho conta-nos um caso em que sua mãe, ainda criança, foi severamente repreendida pela dada, pois começou a demonstrar gosto pelo vinho ("de facto, a escrava que costumava acompanhá-la até junto do tonel, litigando um dia com sua jovem senhora, estando sós, lançou-lhe em rosto a intemperança, chamando-lhe com atroz insulto: Bêbada!") (Confissões, p. 224).
Mônica foi entregue em casamento a Patrício, membro da ordem dos decuriões do Conselho de Tagasta (cidade da Numídia, atual Sukh Ahras, na Argélia, perto da fronteira com a Tunísia, a aproximadamente oitenta quilômetros da costa mediterrânea). Na qualidade de decurião, seu marido provavelmente possuía pelo menos doze hectares de terra, o que coloca o casal numa razoável posição social, já que isso inclui bens como escravos, olivais e vinhas (PEREIRA, 1991: 11). Quando do casamento entre Mônica e Patrício, este teria então cerca de quarenta anos de idade e ela dezessete ou dezoito.
Sua vida conjugal não era das melhores. "Sofria-lhe também as infidelidades matrimoniais com tanta paciência, que nunca teve discórdia alguma com o marido, por este motivo" (Confissões, p. 225). Aqui começa a se afigurar o modelo cristão da boa esposa.
Ela teve uma rígida educação católica, e transmitiu isso ao filho (FÜLLÖP-MILLER, 1993: 76). Tentou, sem sucesso, trazer tanto o filho quanto Patrício para o cristianismo. Agostinho nos dá sua visão de seu pai: "Se o coração do marido era afectuoso, o temperamento era arrebatado" (Confissões, p. 225). Mônica era portanto, aos olhos do filho — futuro bispo de Hipona e santo da Igreja Romana — uma luz a iluminar a casa pagã de Tagasta. "Era verdadeiramente a serva de Vossos servos" (Confissões, p. 226).
Quando Agostinho, ainda criança, adoeceu, Mônica, pensando que o filho estava morrendo, tentou iniciá-lo no sacramentos, para obter a remissão de seus pecados. Porém, quando ele recuperou a saúde, segundo suas próprias palavras, voltou a recair "na imundície do pecado" (Confissões, p. 40).
Com a adolescência de Agostinho vieram novas preocupações para Mônica. Aos dezesseis anos ele passou férias com os pais — pois até então esteve num colégio na cidade de Madaura —, quando seu pai, vendo-o no banho, notou que já entrara na puberdade. "...ele contou-o, todo alegre, a minha Mãe (...) Porém, já tínheis começado a edificar em minha Mãe o Vosso templo e os fundamentos da Vossa santa habitação (...) Por isso, minha Mãe, com tal nova, agitou-se levada de piedosa perturbação e temor" (Confissões, p. 56). Ela temia perder o controle sobre a educação de seu filho.
Mônica não batizou seu filho de imediato; segundo o costume da época, as crianças filhas de católicos não eram batizadas quando de seu nascimento; o batismo só ocorria mais tarde, quando a pessoa tivesse plena consciência da importância do sacramento. Apesar disso, Agostinho foi inscrito no catecumenato (preparação para receber o batismo). Logo depois, Patrício se converteu ao cristianismo. Provavelmente, temos aqui a influência de Mônica.
De qualquer modo, neste período o cristianismo já tinha a aquiescência do Império e é provável que Patrício tenha cedido aos apelos de sua mulher, se convertendo e dando os primeiros ensinamentos cristãos a Agostinho, com a ajuda econômica de um amigo de nome Romaniano — que, durante toda a educação de Agostinho, socorreria a família quanto aos gastos para sua formação, mesmo após a morte de Patrício (o pai de Agostinho morreu no mesmo ano de sua conversão, em 370) (PEREIRA, 1991: 16-17).
Agostinho foi mandado para Cartago a fim de estudar num curso superior, mais uma vez amparado por seu mecenas, Romaniano. Esta emancipação do rapaz trouxe os primeiros conselhos de sua mãe: "Ela me ordenou, que foi com muita veemência que me preveniu, que não fornicasse e sobretudo que não desonrasse a mulher do próximo".
Agostinho vê na mãe um instrumento a serviço de Deus; "De quem eram se não de Vós, aquelas palavras que, por meio de minha Mãe, Vossa fiel serva, pronunciastes aos meus ouvidos?" (Confissões, p. 57). Para Agostinho, Mônica já é nesse momento o alicerce espiritual que o conduzirá em direção da verdadeira fé; ele na verdade, após seu batismo e conversão ao cristianismo, nunca reconsiderou o caráter feminino de sua mãe.
Para o santo ela sempre foi a intermediária entre ele e Deus: "Não era a minha mãe nem as minhas amas que se enchiam a si mesmas os peitos, de leite. Éreis Vós, Senhor, que, por elas, me dáveis o alimento da infância, segundo os vossos desígnios e segundo as riquezas que depositastes até no mais íntimo das coisas" (Confissões, p. 32).
Não devemos considerar literalmente essa tentativa de santificação da vida de Mônica. Quando do momento da concepção da obra Confissões, Agostinho já era bispo de Hipona e, portanto, tinha uma visão teológica de seu processo de cristianização. De qualquer modo, é apenas através dele que podemos vislumbrar a vida de Mônica.
Nesse período de 21 anos que abrange a adolescência de Agostinho até sua conversão e batismo (366-387), Mônica pode ser traduzida em duas palavras que permeiam seu nome na obra Confissões: oração e lágrimas. A primeira é o pedido a Deus, que dê a seu filho a fé verdadeira. A segunda é o sofrimento pelos caminhos da perdição trilhados por Agostinho — as heresias que durante um certo tempo ele abraçou: o maniqueísmo (373-383) e o ceticismo (383-384) (REALE e ANTISERI, 1990: 428-459). Sua vida estava destinada a ser escrita pela dor e esperança, de ainda em vida verem cumpridas suas preces.
E ela teve um sonho. Nele, via-se de pé sobre uma régua de madeira, quando um jovem veio ao seu encontro e perguntou-lhe porque estava tão triste e amargurada. Ela respondeu-lhe que chorava a perdição de seu filho; o rapaz mandou-lhe ficar sossegada, dizendo que onde ela estivesse, ele estaria junto. Nesse momento, o rapaz viu Agostinho ao lado dela, na mesma régua (Confissões, p. 83).
Podemos recorrer à interpretação freudiana quanto às possibilidades do sonho numa possível análise de um inconsciente em Mônica ("O historiador profissional tem sido sempre um psicólogo — um psicólogo amador. Saiba isso ou não, ele opera com uma teoria sobre a natureza humana; atribui motivos, estuda paixões, analisa irracionalidades..." - GAY, 1989: 25).
Este período histórico compreendido entre os séculos IV e VIII é, segundo Jacques Le Goff, a formação - na teoria e na prática - da onirologia cristã (LE GOFF, 1994: 283-333). Na primeira fase desse imaginário bem específico, o cristianismo estava livre das cargas neuróticas de controle que mais tarde incorporaria, tendo o sonho exercido um papel preponderante na formação do imaginário dos homens do ocidente cristão ocidental. A hagiografia do período o tem como ponto convergente da vida da maior parte destes santos, e o sonho de Mônica é o de um tipo muito especial: o que vem diretamente de Deus ("Os sonhos são-nos enviados por espíritos — anjos ou demónios (...) Mas os sonho que vêm directamente de Deus são muito excepcionais — como prova a experiência de sua mãe Mónica" - (LE GOFF, 1994: 316).
Mais: ela não só sonha como interpreta sua mensagem. Após seu sonho divino, ela contou-o a seu filho. Ele deu-lhe uma interpretação maniqueísta ("Narrando-me esta visão, esforcei-me por interpretá-la de modo que ela não desesperasse de vir a ser o que eu era, isto é, maniqueísta") (Confissões, p. 83). Ela, sem hesitar, disse-lhe que ele estava enganado; era ele a se converter e não ela! Isso abalou Agostinho. Mais uma vez ele viu sua mãe como o instrumento da palavra divina: "Mais do que o próprio sonho, abalou-me então aquela Vossa resposta dada por intermédio da solicitude de minha mãe" (Confissões, p. 83).
Nesse objeto onírico de transmissão do logos divino - só mais tarde Agostinho demonstraria um mal-estar, uma incerteza a respeito dos sonhos (LE GOFF, 1994: 317) -, podemos observar em seu inconsciente a intensa preocupação da mãe cristã pelo destino do filho. A alegoria da régua e a posição dos dois sobre ela, pode ser entendida como a inevitabilidade do passar do tempo e a ansiedade pelas preces, onde as preces da mãe ecoam sem resposta. Melhor, a resposta é a da profecia do jovem, segundo Agostinho, o próprio Deus ou um anjo ("Agostinho [...] não teve dúvidas. Aquele jovem que consolou sua mãe e que predisse a sua conversão pela vista e pela palavra era o próprio Deus [ou um anjo por ele enviado - de acordo com a habitual imagem das visões "africanas", segundo observou Pierre Courcelle" - LE GOFF, 1994: 313-314)
Assim, ele atribui ao sonho a sublimação de sua conversão: sua vocação religiosa e existência cristã passa então pelo viés fundamental da angústia da interpretação dos sonhos (LE GOFF, 1994: 317. Le Goff chega a afirmar que a obra Confissões - principal fonte deste artigo - é uma autobiografia onírica). Mais uma vez Mônica é a mediadora responsável pelo passo decisivo de seu filho em direção à verdadeira fé.
Nove anos depois do sonho de Mônica dá-se a conversão de Agostinho (LE GOFF, 1994: 314). Nesse meio tempo, formam-se suas principais virtudes de mãe cristã: as lágrimas, o conforto (no sentido de consolação), a persistência. O episódio mais famoso dessa personificação cristã é o das súplicas que Mônica fez a um bispo — provavelmente o de Cartago — para interceder junto a seu filho, já que seus pedidos não eram atendidos. O bispo teria respondido: "Vai em paz e continua a viver assim, porque é impossível que pereça o filho de tantas lágrimas" (Confissões, p. 85).
Ainda acontece um famoso acontecimento em que Agostinho, desejoso de ir a Roma, engana sua mãe, que não queria que o filho partisse. Ele a fez ficar aguardando a noite inteira num lugar consagrado à memória de São Cipriano enquanto tomava um navio.
Essa passagem das Confissões mostra como Agostinho perpetua a imagem de sua mãe, aquela que faz a intermediação entre o sagrado e o profano, o céu e a terra: "Soprou o vento, enfunou as velas e logo escapou à nossa vista a praia, onde, de manhã cedo, minha Mãe, louca de dor, enchia, com suas queixas e prantos, os Vossos ouvidos, insensíveis àquelas lamentações. Ela, segundo os costumes das mães, e mais ainda que muitas outras, desejava-me sempre junto de si (...) Esses tormentos denunciavam nela a herança de Eva, pois gerava com lágrimas o que com lágrimas dera à luz" (Confissões, p. 120).
Este trecho é bastante significativo. Agostinho reconhece a herança do pecado original, presente em todas as mulheres ("À mulher ele disse: "Multiplicarei as dores de tuas gravidezes, na dor darás à luz filhos [Gn, 3, 16]" - A Bíblia de Jerusalém, 1991: 35). A condenação divina a Eva atinge a mulher no que a Igreja considera como sua atividade essencial: ser mãe e esposa. Trata-se de uma pena hereditária, mais tarde transformada por São Paulo em uma falta hereditária. Agostinho, mesmo na sua visão santificadora da mãe, reconhece o fardo do seu sexo feminino. A mulher na visão da Igreja, terá sempre esse outro lado negativo: o portal de entrada do diabo. Como na interrogação de Tertuliano (Tertullianus, 170?-212?): "Não sabes tu que és Eva, tu também? (...) Tu és a porta do diabo, tu consentiste na sua árvore, foste a primeira a desertar a lei divina" (DALARUN, s/d: 35).
Nas viagens mediterrâneas de Agostinho, Mônica confortou os marinheiros ("Era ela que, nos riscos dos mares, incutia coragem aos próprios marinheiros que costumavam animar os inexperientes navegadores do abismo, quando se perturbam: prometia-lhes a chegada a salvamento, porque Vós, em visão, lho havíeis prometido") (Confissões, p. 131), e pacientemente aguardou até o último momento a conversão de seu filho amado: "respondeu-me (...)que esperava ver em Cristo que, antes de partir desta vida me havia de ver fiel católico" (Confissões, p. 132).
Quando, aos 33 anos — idade simbólica, idade de Cristo —, ele decidiu pela conversão (387), ela exultou ("Transformastes a sua tristeza numa alegria muito mais fecunda do que ela desejava...") (Confissões, p. 207). Tinha obtido sucesso na missão de sua vida. Segundo suas próprias palavras, ela disse ao filho: "Por um só motivo desejava prolongar um pouco mais a vida: para ver-te católico antes de morrer. Deus concedeu-me esta graça superabundantemente (...) Que faço eu, pois, aqui?" (Confissões, p. 229).
Mônica morreu no mesmo ano, aos 56 anos de idade. Mas antes, os dois santos católicos tiveram um diálogo-êxtase em Óstia, numa das passagens mais famosas das Confissões. Agostinho afirma que esse encontro foi obra dos "secretos desígnios Dele", quando então alcançaram a transcedentalidade: "Enquanto assim falávamos, anelantes pela Sabedoria, atingimo-la momentaneamente, num ímpeto completo do nosso coração" (Confissões, p. 228). Uma semana depois, ela caía com febre e falecia.
Agostinho agradeceu a vigília cristã da mãe. Em suas preces pela mãe, ele pede que oremos por ela, e reconhece nela uma "alma piedosa e santa", e completa: "Inspirai, meu Senhor e meu Deus (...) inspirai a todos os que leram estas páginas que se lembrem junto ao altar, de Mónica, Vossa serva, e de Patrício (...) Assim, graças a estas <>, o desejo último de minha Mãe, será mais copiosamente cumprido, com as orações de muitos, do que somente com as minhas" (Confissões, p. 236).
Mônica foi sepultada na cripta da Igreja de Santa Áurea em Óstia. Seu corpo foi descoberto em 1430 e transladado para Roma, primeiro para a Igreja de S. Trifão, e mais tarde para a Igreja que lhe foi dedicada.
A mulher pré-cristã já possuía todos as características básicas que conhecemos do ideal de mulher cristã: o silêncio, a submissão e a abstinência dos prazeres sexuais (CHEVITARESSE, 1991: 113). Logo, o grosso de suas características de "ser inferior" foi herdado da Antigüidade.
Santa Mônica é o modelo desta tarefa pedagógica vital: a formação da conduta moral e religiosa do filho. Incutir pudor, mansidão, e todas essas condutas cristãs é a virtude deste exemplo de comportamento, que, além de tudo, dá o empenho da conversão, em que pese a "debilidade estrutural da intervenção feminina no interior da família" (VECCHIO, s/d: 181).
Por fim, Santa Mônica é santa, não por ter realizado qualquer milagre, ou por ter sido martirizada, como tantos santos cristãos da Alta Idade Média. Ela é santa por ser mãe. Mãe de um santo, logo, um instrumento divino. Ela é o meio para o fim. Sua maternidade é a dos novos tempos, da virada do mundo antigo para o medievo. Sua miraculosidade é a da lágrima, que suplica através da oração a dádiva do Cristo para seu filho (TAVARES, 1990: 106). Suas lágrimas são as lágrimas de Deus: "...enquanto minha Mãe, Vossa fiel serva, junto de Vós chorava por mim, mais do que as outras mães choram sobre os cadáveres dos filhos" (Confissões, p. 83). Seu atributo não possui redenção nem conflito. Ele é a prece atendida, o fervor transmitido.
Com Santa Mônica temos a mãe cristã em toda a sua acepção. A mulher, com seu lado sexual negado pelo ideal cristão, passa o bastão para a mãe, que sofre e vive pelo filho. Embora a Idade Média tenha tido um ideal materno em Sarah, esposa de Tobias (VECCHIO, s/d: 143), esta era judia, e tinha um passado com vários lutos como viúva - apesar de ter sido ouvida por Deus (Tobias, 3, 8-10 - A Bíblia de Jerusalém, 1991: 730-731).
De maneira que, apesar do modelo de Sarah, é em Mônica que se afigura na totalidade o ideal da mãe cristã. Em sua iconografia, ela é representada como uma senhora com grandes sulcos no rosto, olhar triste e mãos unidas em forma de oração. Talvez seja essa a palavra que a define: oração. A mãe serva de Deus, que ora pelo filho. A mãe cristã."

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